sexta-feira, 27 de julho de 2007

Clichetes

Há alguns dias estava assistindo os dois últimos episódios da segunda temporada de Heroes, que não tinha assistido ainda por falta de gumption. Qual foi a minha surpresa – ou melhor ainda, minha surpresa por uma coisa tão clichê ser capaz de me surpreender – ao ouvir, naquelas narrações em off com a voz do Mohinder (e aquela musiquinha de baleias no cio ululando ao fundo) um resumo de tudo que discutimos nesse blog até agora: as coisas importantes da vida, nosso objetivo enquanto vivos, what’s best in life Conan etc etc:

Mohinder: Where does it come from? This quest? This need to solve life's mysteries when the simplest of questions can never be answered. Why are we here? What is the soul? Why do we dream? Perhaps we'd be better off not looking at all. Not delving, not yearning. But that's not human nature, not the human heart. That is not why we are here. Yet still we struggle to make a difference, to change the world, to dream of hope. Never knowing for certain who we will meet along the way. Who among the world of strangers will hold our hand. Touch our hearts. And share the pain of trying (...)

We dream of hope. We dream of change. Of fire, of love, of death. And then it happens. The dream becomes real. And the answer to this quest, this need to solve life's mysteries finally shows itself. Like the glowing light of a new dawn. (…)

So much struggle for meaning, for purpose. And in the end, we find it only in each other. Our shared experience of the fantastic. And the mundane. The simple human need to find a kindred, to connect. And to know in our hearts... that we are not alone.

E lá estava, o óbvio, o que todas as grandes religiões têm como base, o que Jesus dizia enquanto zanzava pela Galiléia há dois milênios atrás, o que os Beatles resumiram em uma única frase:

“All you need is love.”

Um grande, cósmico D’UH! Um clichete intergaláctico!!! OH GOD!!!!!! DON'T GO FORWARD!

Irmãos: Nós viemos do amor, e ao amor voltaremos. A natureza desse amor não nos é clara, mas todos sentimos a vibração dentro de nós. Para muitos essa vibração não é mais do que white noise ecoando em nossos cérebros; para as crianças, os loucos, os artistas, visionários e profetas em geral, é o ar que respiramos. Somos amor, e nossa felicidade é diretamente proporcional à quantidade dessa energia que temos em nós, sempre movendo-se. Por mais brega que isso seja, é verdade. Say the word and you’ll be free… and the only word is love.

Naquele momento, tive que parar de admirar a perfeição plástica do ator que interpreta o Mohinder, ou da Nikki/Jessica. Tive um eclipse mental. Tive que baixar minha cabeça. Todos os meus problemas – todos os problemas do mundo – devem-se à falta de amor, em suas muitas faces. Simple as that. Quanto mais eu confabulo, elocubro e podero, quanto mais acho que estou ganhando pontos na minha eterna esgrima contra a existência, mais o Inefável remove sua máscara sorrindo, toca meu peito com o florete de um modo profundamente condescendente e mostra que estou lutando contra a minha própria sombra, enquanto ao Sol que brilha fora da minha caverna... amor omnia est.

Touché, Inefável.

---- Comentário ao seu informe púbico-------

Gostei bastante. Nossa competitividade poderia ter sido canalizada, com toda sua força irresistivelmente genial e imodesta, de forma equivocada. Como símios que somos (e eminentes filósofos naturais), é difícil resistir à tendência de urrar, sacudir as bolas pra mostrar quem é mais macho (e, cromossomos à parte, eu sou a fêmea mais macho que conheço) e sair mijando pelo blog para marcar o território -- mas parece que estamos conseguindo sublimar isso de algum modo. Nossa competitividade intelectual está trazendo à tona o melhor dos dois, e torço pra que continue assim.

Respeito a sua citação de Rocky. Pode dormir tranquilo que jamais te pedirei para deixar de ser homem...

...mas não resisto à tentação de pedir para que você deixe de ser besta.

Coisas de mulher.

----fim do comentário ao informe púbico----

Pois é, também achei que mandamos bem na nossa discussão inaugural do blog. Alguém devia nos pagar para dar palestras e ofuscar a todos com a radiância de nosso intelecto, além de deixar todo mundo molhadinho com a tensão sexual que tempera, sub-repticiamente ou não, tudo que escrevemos/falamos. Jamais abandonarei a esperança de ganhar dinheiro com os frutos do nosso platonismo.

Fico feliz por você ter gostado da minha citação do Eclesiastes e não ter me perguntado se eu tinha virado crente ou coisa do tipo – além de ter inaugurado o que talvez seja uma nova fase das nossas divagações: o eterno elo entre conhecimento e dor. Ignorance is bliss, but knowledge is power. Até pouco tempo, meu lado super-vilã queria poder, poder e mais poder, e eu estava me entregando ao acúmulo bizarro de conhecimento de modo completamente maníaco. Bliss is for the weak – I wanted POWER!!

Então, a Indesejada das Gentes – que havia me ignorado por 26 longos anos – resolveu acertar suas contas comigo. Ceifou meu siamês Sasha. Colheu meu vira-lata Kevin. Amealhou conhecidos, levou consigo uma avó de olhos verdes que cheirava a violetas e arrancou pela raiz a árvore centenária onde pendurei meu balanço, na qual subi e da qual caí tantas vezes, a que me contava estórias fantásticas enquanto eu sentava em sua sombra – meu avô Délio, esteio de minha personalidade, pilar da família. E, não satisfeita, paira todos os dias sobre meu Fibonacci -- the Jesus of Cats – que definha a cada dia com leucemia, emprestando a cada minuto com ele um desespero agridoce por inevitável.

Perdi meus poderes da forma mais abjeta que existe: ao ter de admitir para mim mesma que jamais tive poder algum, e que a força reside em velejar com paz, com graça, a corrente de dor que irrompeu em minha vida. Meu barquinho de papel foi-se bueiro adentro – e não ouso debruçar-me sobre o buraco como faria antes por saber que a curiosidade matou o gato. Pennywise the Clown está à espera, com seus balões coloridos.

Touché, Inefável.

Ainda nem toquei a superfície da transformação causada pela Morte, mas sou grata por cada crise de choro convulsivo, pois estou finalmente aprendendo a ser gente. Aprendendo o que significa ser GENTE, e deixando o inteli- de lado. Estou imaginando a paz. E citando meu Pessoa favorito: “No meu coração há uma paz de angústia, e o meu sossego é feito de resignação.”

“And if there’s a moral there, I don’t know what it is, save maybe that we should take our goodbyes whenever we can” – Neil Gaiman, Sandman.

Como de hábito, tinha mil coisas para escrever a respeito de conhecimento ser dor, mas acho que já escrevi mais do que o suficiente para um post. Para não perdermos esse train of thought, fica a imagem, e a citação de Byron:


"Sorrow is knowledge, those that know the most must mourn the deepest, for the tree of knowledge is not the tree of life."


So it goes,

--Xochiquetzal.

Um comentário:

Anônimo disse...

ler todo o blog, muito bom