terça-feira, 19 de agosto de 2008

Previously, on LOST:




Ladies and Gentlemen, Children of all ages! Come one, come all!

“No próximo post chocarei a todos com revelações de minha infância como filha-de-ricaço-que-perdeu-tudo-e-teve-que-catar-xepa-na-feira e as conclusões a respeito do lado mais confortável da cerca...”

Foi muito interessante saber que a Bel também é nouveau-pauvre e que, apesar da origem comum, chegamos a conclusões díspares.

Eu fui rica até os 12 anos, mais ou menos. Rica não, podre de rica. Meu pai era a definição do yuppie: três carros importados (em época pré-Gurgel)em garagens chiques pelo país, um plantel de cavalos mangalarga marchador distribuído por fazendas e haras desenhados para causar apoplexia em sem-terra, criação de Rottweilers, caixas de uísque, caixas de eletrônicos, caixas de dinheiro. Meus brinquedos eram quatro pôneis de verdade; meu cachorrinho de estimação era o campeão sul-americano da raça. Tudo bem que quando eu via meu pai ele estava invariavelmente bêbado e cercado de mulheres (ganhando o apelido – incompreensível pra mim na época – de Heleninha Roitman) – ele era rico. Tudo bem que a minha mãe era um destroço emocional cercado de Valium e NOVA por todos os lados – ela era rica. Tudo bem que eu tenha sido criada pela Teresa, minha mãe preta, enquanto meus irmãos se transformavam em pequenos hooligans de calça de Bali e sapato Nauru – éramos ricos. Ricos pra caralho. Todos queriam ser nossos amigos, até meu pai perder tudo, sermos despejados de nosso apartamento de frente pro mar, “convidados a nos retirar” do colégio católico onde estudamos a vida inteira e os credores ameaçarem matar a mim e aos meus irmãos

Anyway. Não me incomodei com a perda de status (mas confesso sentir falta dos meus pôneis), ou em sair de um colégio hipócrita, ou em ver o relacionamento doentio dos meus pais chegar ao fim. Foi uma libertação. A merda que eu pressentia desde que consegui balbuciar “dineilo” finalmente havia batido no ventilador, e eu tinha minha capa de chuva feita de cinismo 100% adolescente. Sobrevivi a mudanças para apartamentos de tamanho gradativamente menor, sobrevivi à falta de estudo (meu diploma de segundo grau, que tirei apenas para poder entrar na faculdade, é um glorioso Telecurso 2000), a falta de família. O resultado é essa colcha de retalhos da minha psique, sempre esperando o pior, incapaz de aproveitar as coisas boas da vida, eternamente em guarda contra a desgraça que espreita a cada esquina... sou instável, fruto do meu meio. Mas a instabilidade que tirou a minha pureza é emocional, e não financeira.

Ler a conversa da Bel com o pai da Bel foi instigante: achei legal, até mesmo porque jamais tive a oportunidade de conversar com o pai da Xochiquetzal sobre coisas desse tipo. Achei digna de nota a seguinte passagem:

Pai da Bel: Na verdade eu torço é para que vc faça as melhores escolhas e encontre a verdadeira felicidade....
Bel: eu preciso de ESTABILIDADE atualmente
Bel: felicidade depois


O que é a verdadeira felicidade? Ela existe? Não sei, só sei que ela está aí. É um conceito absolutamente subjetivo, tão fortemente condicionado pelo meio que mal nos damos conta do que verdadeiramente ansiamos. Recomendo aos questionadores de plantão o livro Felicidade: Uma História, que apesar do adesivinho cretino “Um dos autores do quadro ‘Novos Pensadores’ do Fantástico” na capa, é MUITO interessante e está me dando pano pra manga até hoje.

Para finalizar este capítulo de Lost, concluo meu flashback afirmando que o dinheiro, pelo menos para mim, nunca foi fonte de alegria ou estabilidade. Uma vida decente, in medias res, sim: dinheiro para comer, para ver os amigos, para viajar, para fazer o que se gosta, para não se entupir de Rivotril à noite pensando em como pagar o plano de saúde, sim. Dinheiro para luxo? Nada contra, mas no fim coisas são algemas. No auge da acumulação de bens você pode se descobrir um Houdini acorrentado embaixo d’água, lutando contra o tiquetaquear de seu coração, para perceber tarde demais que um filho da puta trocou os cadeados enquanto você não estava olhando.

Tic. Tac.

E no final, não há platéia.


Perdeu, preibói.

--Xochiquetzal.

P.S. - Filme: "The Prestige" ("O Grande Truque") de Christopher Nolan. Com Christian Bale (YAY!), Hugh Jackman, Michael Caine e Scarlett Johanssen. Pertinente em diversos níveis.

P.P.S. - Não posso esquecer de DAVID BOWIE no papel de NIKOLA TESLA. Mais badass, só com um batmóvel.

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