quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Na Natureza Selvagem






Não sei em que percalços da minha adolescência estava quando li "Na Natureza Selvagem" de John Krakauer, livro-reportagem que conta a história belamente trágica de Christopher McCandless, rapaz americano que, após se formar cum laude em uma universidade de prestígio deixa tudo pra trás e desaparece -- para reaparecer meses depois, morto de fome, num ônibus abandonado no meio de uma floresta do Alasca. Christopher partiu em uma malfadada busca pela "vida de verdade", percorrendo os Estados Unidos de dedão em riste, na iluminação dos bosques de Henry David Thoreau e Jack London.

Só lembro de ter chorado muito -- chorado por McCandless, chorado pela sociedade que ele repudiou e, acima de tudo, chorado por mim mesma, que sentia exatamente a mesma coisa, nos mesmos, exatos termos. O mesmo ódio, o mesmo desespero de animal enjaulado, a mesma ânsia de deixar tudo pra trás e viver enquanto há tempo. Eu não devia ter mais de 16 anos, mas lembro-me claramente das páginas e páginas de diário que escrevi sobre "Na Natureza Selvagem" -- páginas de flagelação por não possuir a coragem ingênua de McCandless e consentir ao jugo esquizofrênico da sociedade. Eu sempre quis fugir. Quando era pequena e os ciganos passavam pela cidadezinha onde meus avós moravam, eu perambulava perto de seu acampamento na esperança de ser roubada por eles.

Os ciganos não me quiseram. Por um tempo alimentei sonhos de entrar prum circo -- frustrados pela minha total inépcia física. Finalmente consegui uma fuga fajuta para Minas Gerais, longe das pessoas e das ruas que conhecia. Senti o prazer de viver incógnita por algum tempo, o prazer de criar um alter-ego, Xochiquetzal Supertramp -- mas a sociedade é a sociedade, não importa onde você se esconda. No matter where you go -- there you are. And there I was, ainda andando de um lado pra outro na jaula, quando "Na Natureza Selvagem" entrou na minha vida via InefávelMail. Devorei o livro. Quis fugir de novo. Mas a essa altura dos acontecimentos eu já estava com o pescoço na canga familiar-financeiro-acadêmica.

Faltou-me a coragem.

Devolvi o livro ao Inefável e fui empurrar a roda como todos os outros bois -- com a cabeça um pouco mais erguida, os chifres um pouco mais vistosos, mas um boi na canga como qualquer outro. Cigana, sim; equilibrista existencial, sim; fugitiva, NÃO.

E o fantasma macilento de Christopher McCandless continuou a assombrar meus sonhos.

Fiquei chocada quando soube que Sean Penn havia comprado os direitos cinematográficos do livro e o estava transformando em filme -- e infinitamente mais chocada quando, tempos depois, aluguei o DVD e tomei o mesmo soco na alma. O filme, irmãos de blog, é uma obra prima.




Chorei de novo, um choro mais velho e por isso mesmo mais amargo. A trilha sonora primorosa de Eddie Vedder embalou meus sonhos, enquanto McCandless sorria pra mim de sua última foto tirada em frente ao ônibus impossível.








Thoughts bleeding,

--Xochiquetzal Supertramp.

2 comentários:

Anônimo disse...

I am you.

Definitely.

Anônimo disse...

Mirror Reader, please stop being me before you run away to join a circus or something. I do NOT hold myself responsible for any decision you make while being me, you hear? On the other hand, I'm considering holding YOU responsible for everything I do or say from now on. Be aware, be very aware. Being two people at the same time can be fun as hell, but don't let the people in the white suits get you!

Looking for the Wild,

--X., the Many-Peopled.