sexta-feira, 11 de julho de 2008

Idiocracy.



As pessoas têm o direito de permanecer estúpidas.
Tudo o que dizem pode e será utilizado contra elas neste blog.
As pessoas têm o direito a interlocutores igualmente estúpidos.
GENTALHA! GENTALHA! HUMPF!!



Idiocracy.



Ando pensando em escrever. Pensando muito, pensando sem parar, mas incapaz de colocar os pensamentos aqui -- por conta do trabalho, das leituras a pôr em dia, da confusão geral e indignação perante esse mundo torto em que me colocaram. Pára essa merda que eu quero descer.

Após semanas de cuidadosa confabulação interna e extenuantes exercícios de retórica comigo mesma -- semanas tentando me situar nesse world gone wrong e os seres que o partilham comigo, pensei, pensei, pensei e voltei ao ponto de partida:

ESTOU CERCADA DE IDIOTAS.

Arrogante pra caralho, né? Doeu até em mim, que carrego a pecha de pedante desde a primeira série, ao responder "Éqüidna, cachalote e caribu" à pobre professorinha que me pediu três exemplos de mamíferos.

Mas é. Sempre me desesperei na minha condição de ilha, sempre estive semi-sozinha, mas agora que moro em uma cidade pequena pela primeira vez na vida, meu horror perante a ignorância que me cerca está tomando proporções Cuthúlicas.

"Vamos simbora/pro bar/beber, cair, levantar" é martelado na minha cabeça das onze da noite às quatro da manhâ de TODA sexta e sábado, desde que eu me mudei para um apartamento lindo -- a trinta metros da "Casa de Forró" mais popular da cidade. Meus pensamentos diários são interrompidos a cada três minutos (em média) por essa música ínfera. CARACA, como se diz aqui. É irresistível. Não consigo completar um raciocício sem que esse EXU disfarçado de música venha cavalgar meus pensamentos:

"Vamu simbora
pru bar
bebê, caí, levantchá
Vamu simbora
pru bar
bebê, caí, levantchá
bebê, caí, levantchá
bebê, caí, levantchá
bebê, caí, levantchá
SI VOCÊ QUISÉ MI ACUMPANHÁáÁááÁÁ..."

Essa ode à estupidez interrompe todos meus processos mentais. Tento relembrar a diferença entre os conceitos platônicos, aristotélicos,epicuristas e estóicos de felicidade: BEBÊ, CAÍ, LEVANTCHÁ. Faço compras no supermercado, paro diante da seção de padaria e me pergunto se levo sonhos ou não: BEBÊ, CAÍ, LEVANTCHÁ. Explico a diferença entre borrow e lend a uma turma de business English: BEBÊ, CAÍ, LEVANTCHÁ. Escovo Pandora, minha Persa arredondada: BEBÊ, CAÍ, LEVANTCHÁ. Interrompo a leitura de "Jangada de Pedra" de Saramago por conta de BEBÊ, CAÍ, LEVANTCHÁ.

PUTAQUEPARIU!


Não tenho como exorcizar esse encosto musical. Dizem que a melhor maneira de se livrar de uma música presa em sua cabeça é cantarolá-la sem cessar até que ela passe pra outra pessoa; se vocês têm o azar de saber de que "música" estou falando, espero ter sido bem-sucedida.

O forró foi a primeira coisa que me marcou aqui. Depois veio a tentativa de me comunicar com as pessoas na rua, com meus colegas de trabalho: as referências culturais são Zorra Total, a novela das oito, o "jornal" EXTRA. Bordões de TV repetidos como mantras, Paulo Coelho e O Segredo tidos como gurus pelos poucos letrados, Luciana Gimenez é ídolo, Faustão no último volume aos domingos, o povo fazendo fila na inauguração da nova loja Casa & Vídeo ("Minina, o Uóshton mi deu uma chapinha lá da Casivídil qui é ótima")...

Como pode, como pode, como podem as pessoas limitarem sua dieta à lavagem cultural despejada no chiqueiro de suas TVs pela mídia? Como pode ninguém contestar NADA, ninguém querer pensar em NADA, ninguém almejar mais, sorrisos idiotas estampado na cara, pessoas que vão pru bar, bebem, caem, levantcham, ligam a TV à noite, acompanham a programação e vão dormir?

Gostaria de poder ligar o foda-se, mas não consigo. Sou professora e não desisto nunca -- pelo menos luto por não desistir. Não posso ser mais uma burnt out. Não posso. Mas quero.

"The mass of men lead lives of quiet desperation." - Henry David Thoreau

Queria simplesmente dizer não.


Yep.



Up, up and away,

--Xochiquetzal.

5 comentários:

Bel disse...

eu moro em goiás, estamos então mais ou menos na mesma situação desesperadora (sim, eu conheço a música "beber, cair e leantar". aviões do forró (y)).
olha, depois de um tempo você acostuma... eu aprendi até a admirar a estupidez num certo nível, pessoas que se contentam com tão pouco, garotas que só se preocupam com balada e quem tem o namorado mais rico, garotos que gastam 700 reais numa porcaria de som pro carro... sabe, eles são tão felizes nesse mundinho limitado e raso... mantendo certa distância, é completamente compreensível uma admiração tediosa. é como assistir um boi pastar, sabe?
ignorance is bliss, já dizia o poeta. acho que ele tem bastante razão.
xoxo

Anônimo disse...

MENÇÃO HONROSA:

"é completamente compreensível uma admiração tediosa. É como assistir um boi pastar, sabe?" (2)

Bel, eu amo você.

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Esse meu desabafo teve muito de inveja. We're on the same page: há de se admirar a estupidez -- afinal os estúpidos estão sempre satisfeitos, e há alegria maior em conseguir estar satisfeito? Sem pensar os idiotas conseguiram alcançar esse objetivo efêmero de toda a humanidade: a felicidade (que brilha no ar/como uma estrela/que não está lá, na música de um estúpido aí).

Eu tento ser feliz desde os três anos de idade, acho. Conhecimento gera sofrimento. Acho que nosso problema, nós, seres pensantes (apesar de não sermos Natalie Portmans, Asia Carreras ou -- OMG -- Vin Diesels: http://www.cracked.com/article_15753_8-celebrities-you-didnt-know-were-geeks.html), é nossa ridícula sede de poder.

Ignorance is bliss, baby, but knowledge is power.

Sic sempre tyrannus,

--X.

Bel disse...

knowledge is power in theory. é como "all you need is love"; muito bonito de falar, mas na realidade não se aplica.
afinal, se somos espertinhas, cadê nosso poder? ou não somos tão espertas quanto imaginamos?

money is power, unfortunately. conhecimento deixou de ser poder prá ser um mero artefato de luxo, uma raridade. em aplicação real, infelizmente, conhecimento por si só não é muita coisa. metade das pessoas muito inteligentes que eu conheço estão, mais ou menos, na mesma situação que nós: insatisfeitas, injuriadas, revoltadas e impotentes perante o mundo.

mesmo assim, não troco meu cérebro por meio pedaço de amendoim só pra ser feliz, máneimorta. afinal de contas, concordo plenamente contigo sobre a sede de poder =)

será que nós somos patéticos e -OMG!- não sabemos disso?

kisses, my dear ;*

Anônimo disse...

Knowledge is power in theory.

Que merda isso.

Sorte minha ser uma pessoa totalmente "teorética", ou já teria começado a desenhar animaizinhos na parede com meu próprio cocô há tempo...

Acho que uma enorme parte da angústia existencial que carrego vem da constante negação disso aí: tudo indica que, apesar de todo nosso intelecto, cultura, refinamento e infinita capacidade de ironia, somos patéticos.

Isso me dá cãimbras no cérebro. É o equivalente existencial de se descobrir que é adotada aos 27 anos de idade: sinto-me completamente traída pelo mundo.

Acho que vou continuar tentando até os 30 anos. Depois disso, ou caio no establishment (filhos-NOVA-plástica-novela-Antônio Fagundes) ou viro hippie.

Cansei de ser esperta!

GENTALHA!
GENTALHA!
HUMPF!

=)

Bel disse...

caso você decida virar hippie, espera até os MEUS 30 anos e me guarde um lugar especial no seu trailer. a gente pode usar nossa (suposta e teórica) inteligência pra investir em miçangas e brincos feitos com casca de árvore. quem sabe assim a felicidade nos encontra?
i'm drunk. xoxo.