sexta-feira, 3 de julho de 2009

A Momentary Lapse of Reason






Ler. Ler para não enlouquecer, ler para não matar alguém, ou a si próprio. Ler para encontrar a mim mesma nos outros. Ler.

Leio desesperadamente desde muito pequena, e a literatura sempre foi a âncora da nau
desgovernada que sou desde... bem, muito pequena.

Muito bonito tudo isso, mas o que eu gostaria de dizer é que acabo de me dar conta que ando lendo significativamente menos desde que entrei na downward spiral na qual me encontro/encontrava. Não me lembro da última vez que tive paz para organizar meu espírito nas palavras dos outros, e isso me assusta. Por algum tempo pensei que finalmente não precisava mais da muleta literária para me apoiar nesse mundo -- que poderia sair mancando realidade afora com a graça de um paciente terminal de Parkinson sem maiores preocupações do que...

*INTERROMPEMOS ESSE POST PARA UMA PAUSA ETÍLICA*

Pois então... desde a volta do Huno a seu estado de origem, comecei a aprender aos tropeções a beber a gloriosa cerveja -- que fiz questão de desprezar publicamente nesses dez anos de abstenção dos fermentados. "Odeio cerveja, cerveja, engorda, eca cerveja", dizia a antiga ninja Sparrow, do alto de suas gloriosas quatro doses de rum e a meio caminho do banheiro, de onde só sairia para o ocaso humilhante de suas aspirações piratas -- entre risadas de lúpulo do Huno e do Gringo.

Então: estou aprendendo a beber cerveja aos 28 anos de idade. Olhem isso. Neste momento de meu sábado fracassado, pouco após escrever o post sobre minha atual depressão, resolvi abrir as duas garrafas de cerveja da geladeira e bebê-las sozinha, entre tatus e meu acervo de vídeos do YouTube. Alegria, alegria.

Um dos motivos de estar bebendo absurdamente tanto -- para meus padrões de consumo
Amish -- nessas últimas semanas, além da maravilhosa descoberta da suavidade dos fermentados sobre o estupor dos destilados, tem a ver com o fato de eu estar buscando limites alcoólicos que deveria ter adquirido há muitos anos atrás. Boldly going where no one has gone before, but ten years later, grr.

Logo, estou tropeçando em minhas limitações alcoólicas, catando milho no teclado, pedindo a Dionísio que o que eu escreva agora esteja de alguma forma reconhecível como proto-texto amanhã -- quando ficarei bêbada de novo para evitar a ressaca.

Ah. Aproveito o momento para lamentar a morte anunciada do brilhante Caros Leitores, que me privou de um ângulo singularmente inteligente de ver a vida. Choro, vela e fita amarela ao Caros Leitores -- e votos de que Lord W. volte a agraciar a blogosfera com sua visão deliciosamente aguçada do mundo o mais rápido possível.

Acabaram-se as duas garrafas de Brahma, acabou-se o maço de Marlboro que eu tinha e minha seleção de vídeos do YouTube... agora estou só com meus pensamentos bêbados, ainda me acostumando a eles. Tantas coisas a dizer e tanto

(série de palavras incompreensíveis)

esses malditos dedos que se recusam a fazer o que o meu cérebro manda. MUNDO INJUSTO, INJUSTO!

Enfim. Estava falando da drástica redução de meu ritmo de leitura e da angústia silenciosa que tal redução me causa. Descobria-me confusa, irritada, nervosa por não
encontrar a palavra impressa que representava perfeitamente minha confusão, nervosismo, irritação. Não me lembro (o que não quer dizer muita coisa) de ter me abstido da leitura voluntariamente antes. Tudo muito novo pra mim, essas coisas tudo.

Quando estava hospedando meia dúzia das mais adoráveis pessoas insanas do mundo durante o festival de jazz e blues, me deparei com minha antiga coletânea de versos de Pessoa no banheiro de hóspedes -- colocada lá como laxante literário. Comecei a reler os versos em êxtase, esquecida de seus efeitos narcóticos, deslembrada dos ecos de mim mesma que encontro no Poeta.

Tinha planos remotos -- antes de começar a beber -- de digitar verso a verso um poema do Portuga que é a descrição do eu de agora, por mais piegas e comprometedor que isso seja. Infelizmente terei que esperar até ter acesso à Web para procurar tal poema online -- sem condições de digitar agora. No way.

A literatura é minhs religião, e venho me sentindo afastada de meu Deus por muito, muito tempo.

Há um desterro emocional que acompanha a falta de leitura e me deprime horrivelmente.

Uma tarde inusitada, conversando com a Lea entre café e cigarros na cozinha de casa, ela confessou partilhar de meu credo, a Literaura sendo capaz de englobar todas as ciências sem se comprometer com nehuma delas. Esqueci-me do nome da Musa da poesia lírica -- onde estás, Google, quando preciso de ti -- mas hei de lembrar-me.

HEI DE FICAR BOA PARA VINGAR-ME.

Mas, enquanto a sobriedade não vem, sinto-me livre para discorrer sobre minha atual confusão a respeito de todas a idéias que tive e deixei de ter a respeito de Deus -- ou de pelo menos o que eu arrisco a chamar de Deus. O ateísmo não me cai bem -- há em mim um senso (muitas vezes enganoso) do Inefável que repele sua total negação. O Cristianismo para mim é uma negação por si só, e as alternativas -- bem, por mais simpáticas que sejam, exalam aquela (aura?) de ovo podre da idéia comum da Deidade.

E fico aqui, entre o cinismo de meu intelecto e o maravilhoso de meu coração, mais perdida do que bala em boca de banguela, tentando desesperadamente fazer sentido do que está dentro de mim...

...quando me deparo com as Tábuas da Lei nos versos de Pessoa:


Há metafísica bastante em não pensar em nada.

O que penso eu do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.

Que idéia tenho eu das cousas?
Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?
Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma
E sobre a criação do Mundo?

Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos
E não pensar. É correr as cortinas
Da minha janela (mas ela não tem cortinas).

O mistério das cousas? Sei lá o que é mistério!
O único mistério é haver quem pense no mistério.
Quem está ao sol e fecha os olhos,
Começa a não saber o que é o sol
E a pensar muitas cousas cheias de calor.
Mas abre os olhos e vê o sol,
E já não pode pensar em nada,
Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos
De todos os filósofos e de todos os poetas.
A luz do sol não sabe o que faz
E por isso não erra e é comum e boa.

Metafísica? Que metafísica têm aquelas árvores?
A de serem verdes e copadas e de terem ramos
E a de dar fruto na sua hora, o que não nos faz pensar,
A nós, que não sabemos dar por elas.
Mas que melhor metafísica que a delas,
Que é a de não saber para que vivem
Nem saber que o não sabem?

"Constituição íntima das cousas"...
"Sentido íntimo do Universo"...
Tudo isto é falso, tudo isto não quer dizer nada.
É incrível que se possa pensar em cousas dessas.
É como pensar em razões e fins
Quando o começo da manhã está raiando, e pelos lados das árvores
Um vago ouro lustroso vai perdendo a escuridão.

Pensar no sentido íntimo das cousas
É acrescentado, como pensar na saúde
Ou levar um copo à água das fontes.

O único sentido íntimo das cousas
É elas não terem sentido íntimo nenhum.
Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me, Aqui estou!

(Isto é talvez ridículo aos ouvidos
De quem, por não saber o que é olhar para as cousas,
Não compreende quem fala delas
Com o modo de falar que reparar para elas ensina.)

Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e sol e o luar,
Então acredito nele,
Então acredito nele a toda a hora,
E a minha vida é toda uma oração e uma missa,
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.

Mas se Deus é as árvores e as flores
E os montes e o luar e o sol,
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;
Porque, se ele se fez, para eu o ver,
Sol e luar e flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo árvores e montes
E luar e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como árvores e montes e flores e luar e sol.

E por isso eu obedeço-lhe,
(Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?).
Obedeço-lhe a viver, espontaneamente,
Como quem abre os olhos e vê,
E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,
E amo-o sem pensar nele,
E penso-o vendo e ouvindo,
E ando com ele a toda a hora.


Ai meu estomo. Vou lá tomar um omeprazol e já volto.

(18 horas depois...)

Tenho que aprender a apreciar a vida com moderação.

Xochiquetzal, publique seus ramblings acima como mea culpa e largue essa vida bandida.

Live fast die young my ass
-- eu quero ser feliz Silviommmmm.

Shit.

--Xochiquetzal, Heterônima de uma Menina Aí.


Um comentário:

Dead lord reading disse...

The blog is dead, but the head is still spinning fast =).